Um pedacinho da minha alma...

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Era uma vez...

Em uma cidade bem pequena e antiga, daquelas onde todos se conhecem, existia um castelo enorme. Esse castelo possuía portões de ferro, lanças afiadas, uma ponte que mais lembrava um calabouço e era feito de blocos de pedras enormes.
Todos da cidade que pegavam a grande estrada para o norte, passavam na frente dele e se perguntavam quem seria o dono misterioso que nele morava. Ele ficava distante de tudo, no alto de uma colina bem íngreme, se não bastasse a imagem assustadora, ele ainda parecia completamente abandonado.
Em um dia chuvoso, um senhor acabou atolando sua charrete na colina, ele não era daquela cidade, ele vinha de uma cidadela ainda menor ao leste, trazendo consigo sua filhinha adoecida. Como ele não conhecia a cidade, saiu a procura de ajuda por perto e a única coisa que pode ver através dos clarões provocados pelos raios, foi o velho castelo. Na verdade ele parecia muito mais vivo com aquelas luzes todas, e o senhor não sentiu medo algum, pelo contrário, ele só queria um lugar seco para sua pequena se abrigar.
Ele correu pela ponte e bateu no portão gigante, o barulho foi estrondoso, mais potente do que qualquer trovão daquela noite. Ele bateu mais algumas vezes mas ninguém atendeu. Com o desespero ensurdecendo seus pensamentos ele forçou o portão, e para sua surpresa ele estava apenas encostado. O senhor voltou e pegou a pequenina em seus braços, ambos entraram castelo a dentro.
O interior do castelo era completamente diferente do que se via por fora, era tudo claro e arejado, um pouco confuso talvez, decorado com móveis de todas as épocas, cortinas de várias cores e tinha um aroma místico no ar.
Ele deitou sua frágil menininha em um sofá confortável, logo em seguida foi adentrando nos cômodos, afim de encontrar o dono, se desculpar pela invasão e pedir ajuda. Quanto mais ele conhecia, mais ele se encantava, o castelo parecia uma casa de bonecas, daquelas que você sonha acordado.
Depois de vasculhar a parte de baixo, ele subiu uma escada comprida e curva, que dava no andar superior. Olhou tudo, não havia sinal de presença na casa, apenas aquele cheiro delicioso que continuava no ar. Era uma mistura de flores do campo e âmbar, pêssegos e cidreira, uma mistura curiosa e perfeita.
De repente ele percebeu uma luz fraca no final de outra escada, ela era escondida bem no final do corredor lateral do castelo e o cheiro também parecia vir de lá. Movido por sua curiosidade, subiu silenciosamente cada degrau, um por um, controlando a respiração, afinal, não sabia ao certo o que podia encontrar.
Quando chegou ao último degrau ele parou, quase que esperando ser percebido, mas após alguns segundos percebeu que continuava sem ter sua presença notada. Ele tocou a maçaneta e empurrou a fresta já aberta, a luz fraca vinha de uma vela, queimando seus últimos milímetros de pavio. O perfume vinha de um pequeno queimador de essência, uma linha fina de fumaça subia conforme o líquido evaporava.
Se não reparasse quase não veria, no canto do quarto havia uma cesta, e algo se mexia, e de vez em quando fazia um som baixinho, quase como um filhote.
- Um cachorro talvez?
Ele deu alguns passos, e quando chegou bem perto pode ver que o que havia no cesto nada mais era do que um bebê, com o rostinho rosado e olhos cor de esmeralda.
-Mas o que um bebê faz sozinho no terceiro andar de um castelo vazio?

O senhor pegou o pequenino no colo e desceu para se juntar a sua filha. Ele conseguiu alguns biscoitos na cozinha e um pouco de leite, deixou de comer para dar as duas crianças. Pegou alguns cobertores num armário próximo e as cobriu, cantou uma música linda de ninar e quando acariciou seus rostinhos, uma coisa mágica aconteceu.
O bebê começou a ser suspenso no ar, seu cobertor caiu, ele girava e uma luz prateada começou a circular por ele, uma forma estranha se projetou e num piscar de olhos ele se transformou em uma bela donzela.
Sem entender nada o senhor perdeu as forças e quase caiu, com o sorriso mais meigo do mundo a donzela explicou:

"Muitas vezes usamos os olhos físicos para discernir, avaliar e julgar as coisas. Esse castelo parece sombrio, mas na verdade não existe lugar mais quente e acolhedor que este. As pedras parecem grotescas e as lanças perigosas, mas no seu interior a sutileza é agradável aos olhos. A ponte intimida, mas é apenas para separar os bons dos maus corações.
Você veio guiado pelo amor, o amor de sua filha, entrou com a humildade e saiu com a bondade, tirou da sua boca faminta para dar ao próximo. Alimentou e ninou uma criança indefesa, e sei que faria muito mais ao sair daqui. Levaria as duas e continuaria deixando de ter, para dar. Por isso quero que olhe sua pequena..."

Ao olhar, o senhor começou a soluçar de emoção, sua filha estava corada, com um sorriso sereno no rosto, um brilho intenso nos olhinhos e disse:

- Vamos pra casa papai?

Assustado e emocionado ele olhou para o lado, onde a linda mulher estava até então, mas quando se deu conta ela já não estava mais lá, a chuva havia parado, e apenas o perfume inesquecível ficou no ar.

Ele foi embora levando pelas mãos seu bem mais precioso, a vida de sua filha, o amor incondicional que não julga, não fere e não acaba.

"Os mais belos tesouros são escondidos nas mais escuras profundezas, encontra-los não é sorte e sim merecimento."

3 comentários:

stephan disse...

Amandinha,bonito isso

Caioni disse...

muito bom!

Roberta disse...

Algumas vezes os "tesouros" são encontrados em cavernas feias e escuras e "monstros" são encontrados em berços de ouro. Boa semana Mandinha